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Dona Marlo Medeiros, 58 anos, toma banho na bacia para aproveitar a pouca água que chega (Foto: Anderson Barbosa/G1) |
Quem mora em Currais Novos, um dos maiores municípios da
região Seridó potiguar, compreende a necessidade de racionar água, mas
reclama quando o esquema do rodízio falha. As bombas podem quebrar ou outros
imprevistos acontecerem, fazendo a espera pelo reabastecimento ainda mais
longa. No bairro José Bezerra, que fica na parte mais alta da cidade, os
moradores dizem que não têm água nas torneiras há duas semanas.
Enquanto aguardam, há gente que toma banho em bacias para
não desperdiçar nada. Outros deixam as torneiras permanentemente abertas para
aproveitar qualquer gota que escorra pelo encanamento.
A falta de chuvas e o baixo nível de água no açude que
abastece a cidade levaram a Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte
(Caern) a adotar um sistema de rodízio semanal para que o fornecimento não seja
suspenso por completo. Quem hoje recebe água pelas torneiras, só vai vê-la novamente
daqui a sete dias. O município tem 44 mil pessoas.
A dona de casa Maria das Graças Araújo, de 61 anos, diz
nunca ter passado por um período de falta d'água tão ruim. “Nunca sofremos
tanto”, conta. “Tem que ficar pastorando, vigiando. A bica fica aberta o tempo
todo. Se cair água, já vai para dentro do balde. Não podemos perder um minuto
quando a água da Caern chega”, diz ela.
Na casa ao lado mora Marli Medeiros, de 58 anos. Ela
conta que toma banho sobre uma bacia para aproveitar a pouca água que tem. “É
assim todos os dias. A água que chega a gente guarda na caixa, em baldes, onde
dá. Na hora de tomar banho, eu fico em pé em cima da bacia e deixo a água
descer pelo corpo. O que cai na bacia uso novamente. No fim, a água já serve
para dar descarga no banheiro e molhar as plantas”, explica.
O G1 visitou o açude de Currais
Novos, o Dourado, que fica a 170 quilômetros de Natal. A capacidade de
armazenamento é de até 10,3 milhões de metros cúbicos de água, mas de acordo
com a medição mais recente, feita no último dia 21 pelo Departamento Nacional
de Obras Contras as Secas (Dnocs), há apenas 0,29% de água no local - já dentro
do chamado volume morto. A Caern acredita que o Dourado deve secar por completo
em menos de uma semana.
A água que ainda existe deixou de ser retirada e tratada
pela companhia na terça-feira (28), mas já não servia para o consumo humano.
"Dava apenas para os serviços domésticos, como lavar roupa, tomar banho e
cozinhar. Para beber, nem pensar. Agora, não serve para mais nada. É suja e tem
mau cheiro. Impossível tratar”, ressalta Lúcia de Fátima, que trabalha no
escritório local da Caern.
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Água do açude Dourado, em Curais Novos, deixou de abastecer a cidade na terça-feira (28). Pescadores e urubus tentam aproveitar o pouco que ainda resta (Foto: Anderson Barbosa) |
Mesmo assim, ainda é possível encontrar pescadores que
insistem em tirar do reservatório o sustento de casa. Lado a lado com urubus,
Francisco de Assis pesca enquanto ainda dá. “E eu vou fazer o quê? Ainda tem
peixe aqui. São pequenos e poucos, mas é o que tem para comer. Quando o açude
secar e os peixes morrerem, eu vejo outra coisa para fazer”, afirma.
José Eudes é chefe do escritório da Caern em Currais
Novos. Com a suspensão da retirada da água do Dourado, o abastecimento ficou
totalmente dependente do açude Gargalheiras, em Acari. E para que a água chegue
a todos, a companhia dividiu a zona urbana de Currais Novos. Há 10 dias eram
cinco áreas. Agora, são sete. "Durante 24 horas, os equipamentos de
tratamento bombeiam a água retirada do Gargalheiras para uma das regiões,
enquanto as demais aguardam pela vez. No dia seguinte, segue o rodízio",
explica.
Uma das soluções apontadas pelo gerente seria fazer um
engate rápido na tubulação da adutora Armando Ribeiro Gonçalves, em Jucurutu.
“De lá até Currais Novos, são 75 quilômetros. O serviço é necessário para
resolver a dependência que o município tem do açude Gargalheiras, em Acari, e
do próprio açude Dourado. Estamos tentando essa obra junto com o Dnocs, mas a
previsão é de começar o serviço somente em janeiro, com conclusão de seis
meses. Até lá, para que Currais Novos não entre em colapso se não chover, a medida
seria a escavação de cacimbões [poços] no próprio Gargalheiras”, acrescenta.
O prefeito Vilton Cunha lembra que em 2004 a população de
Currais Novos também viveu uma crise, mas não como agora. "O momento é
difícil, mas tenho certeza que vamos superar. Temos carros-pipa abastecendo a
zona rural e estamos tentando escavar os cacimbões no Gargalheiras. Enquanto
isso, pedimos a contribuição da população para que não desperdice água. E
também pedimos a Deus que traga um inverno mais rigoroso”, afirma.
Andreson Barbosa e Fred Carvalho/G1 RN
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