Marco Antônio Teixeira, cientista político e professor do
Departamento de Gestão Pública da FGV, resumiu: "Acho que as
manifestações, apesar de grandes, não foram do tamanho que os manifestantes
esperavam. "Por outro lado, elas também não foram tão pequenas quanto o
governo gostaria."
"O efeito nós vamos sentir na semana que vem, com o
retorno das atividades do Congresso vai dar para medir quais serão os
desdobramentos", afirmou.
A cientista política e pesquisadora do Cetesp-FGV, Lara
Teixeira, também pontuou que ainda está cedo para entender os reflexos das
mobilizações desta sexta.
"A gente não consegue mensurar quantas pessoas não
foram trabalhar porque aderiram à greve e quantas não foram porque não
conseguiram chegar ao trabalho. Mas o comércio, por exemplo, sentiu. O dia teve
um movimento pior que de feriado, alguns comerciantes disseram. O transporte
público parou o dia todo em São Paulo. Então é possível dizer que a greve foi
sentida."
"O impacto poderá ser sentido na decisão dos
parlamentares quanto às reformas. Mas ainda é preciso esperar que eles comecem
a se manifestar para saber se essa greve terá um efeito."
No entanto, para Antônio Lavareda, cientista político da
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), as manifestações
"falharam". Ele acredita que, por causa da baixa quantidade de
pessoas na rua e dos incidentes de confronto, "os opositores às reformas
fizeram um gol contra".
A sexta-feira começou e terminou com greves e
manifestações por todo o país. Convocadas pelas principais centrais sindicais
brasileiras, elas tinham como alvo duas das principais medidas defendidas pelo
governo de Michel Temer: a reforma trabalhista e a reforma da previdência.
"O cidadão comum assistiu a um espetáculo de
fogueiras acesas nas rodovias, barricadas no centro, o transporte público
interrompido, aeroportos fechados. São manifestações com teor de violência
muito elevado que não servem para esse trabalho que a oposição quer fazer, de
mobilizar os cidadãos contra as reformas", disse.
Questionado pela reportagem sobre qual seria o impacto
dessa greve geral para o governo, Lavareda rejeitou a nomenclatura dada pelos
organizadores do movimento. "Qual foi greve geral? A nomenclatura está
equivocada. Para ser geral, precisa ao menos ser substancial. A greve só
aconteceu nos transportes."
Para ele, nem governo, nem Congresso sentirão qualquer
impacto com a mobilização desta sexta-feira.
"Se fosse uma manifestação com adesão maciça da
sociedade, isso intimidaria os congressistas. Mas ficou claro que eram setores
específicos, então os parlamentares vão se sentir mais à vontade para votar as
reformas sem pressão."
Futuro das reformas
As principais reivindicações dos manifestantes são
relacionadas às reformas que estão em pauta no Congresso. A trabalhista já
passou na Câmara dos Deputados e agora tramitará no Senado, enquanto a da
Previdência já foi rejeitada uma vez e deverá ser posta em pauta novamente em
breve.
Marco Antônio Teixeira, da FGV, considera que a greve e
as manifestações convocadas foram resultado da falta de diálogo do governo ao
propô-las.
"O governo está fechado para o diálogo porque não
quer fazer concessão, ele está fechado com a planilha. E quando negociou, abriu
diálogo para setores que já são privilegiados, o que deixou o povo mais
insatisfeito", disse.
Ele pontua que, diante das manifestações e da
impopularidade da medida, parlamentares irão colocar na balança o possível
"custo eleitoral" de um apoio à reforma.
"O que está em jogo pra muitos não é só apoiar ou
não a reforma, mas é a eleição de 2018. Aí tem um paradoxo grande, porque o
governo Temer já está devastado na avaliação da população. E o apoio parlamentar
explícito na reforma da previdência pode ter um alto custo eleitoral."
Antônio Lavareda, porém, acredita que as manifestações
ficaram muito "radicalizadas e localizadas em setores sindicalistas, com
penetração de black blocs" e que, por conta disso, acabarão "ajudando
o governo" nas negociações para aprovar a reforma da previdência.
Destaque
Ao longo do dia de manifestações, Michel Temer preferiu
não se pronunciar publicamente, mas soltou uma nota oficial do governo ao final
da tarde se posicionando sobre os atos.
Ele afirma que "houve a mais ampla garantia ao
direito de expressão, mesmo nas menores aglomerações" de manifestantes.
"Infelizmente, pequenos grupos bloquearam rodovias e
avenidas para impedir o direito de ir e vir do cidadão, que acabou
impossibilitado de chegar ao seu local de trabalho ou de transitar livremente.
Fatos isolados de violência também foram registrados, como os lamentáveis e
graves incidentes ocorridos no Rio de Janeiro", diz o comunicado, que
termina sinalizando a continuidade das reformas.
"O trabalho em prol da modernização da legislação
nacional continuará, com debate amplo e franco, realizado na arena adequada
para essa discussão, que é o Congresso Nacional".
Ainda na manhã de sexta, no entanto, o ministro da
Justiça, Osmar Serraglio, disse à Rádio CBN que a greve se limitaria a
sindicalistas e que "inexiste".
"Você pega milhares de pessoas obstruídas por 15,
20, 50 pessoas. As pessoas estão querendo ir trabalhar e estão sendo
obstruídas", afirmou.
Para cientistas políticos ouvidos pela BBC Brasil, porém,
quem se destacou mais diante de toda a situação foi principalmente o prefeito
de São Paulo, João Doria.
"É curioso que o Doria falou mais sobre uma greve do
que o próprio Temer, que era o alvo dela. O Doria está chamando a todo momento
o debate nacional pra ele, na perspectiva de enfrentamento. Hoje, ele chamou o
pessoal que participa da greve de 'vagabundo'. Está mais agressivo do que o
próprio alvo dos grevistas, que é o governo federal", pontuou Marco
Antonio Teixeira, que aposta na candidatura do tucano para a Presidência em
2018.
"O Doria não saiu de campanha até agora. A questão é
se ele vai ter fôlego pra continuar em campanha até outubro de 2018. Está muito
claro que ele continua em campanha, mas não sei nem se ele tem clareza pra
quê", observou Lara Mesquita.
Pelo menos cinco ônibus foram incendiados por
manifestantes no Rio de Janeiro.
Dia de greve
Mais de 150 cidades em todos os Estados registraram
paralisações e protestos contra as reformas Trabalhista e da Previdência nesta
sexta-feira, quando movimentos sociais e sindicatos convocaram uma greve geral.
Desde o início da manhã, categorias de trabalhadores
bloquearam vias em Vitória, Florianópolis, Belo Horizonte, São Paulo, Rio de
Janeiro, Salvador, Brasília, Recife, São Luís, Boa Vista e outras cidades. Na
maioria dos casos, a Polícia Militar dispersou manifestantes com bombas de gás
lacrimogêneo.
Nas capitais, lojas e bancos ficaram fechados, além de
escolas municipais e estaduais. Em São Paulo, colégios particulares também
aderiram.
Em São Paulo, a Polícia Militar dispersou o bloqueio do
acesso ao aeroporto de Guarulhos e impediu uma manifestação dentro do aeroporto
de Congonhas.
À noite, cerca de dezenas de milhares de pessoas se
reuniram no Largo da Batata, na zona Oeste da cidade. Manifestantes cantavam
"essa reforma não vai passar, o povo na rua vai barrar". Eles
seguiram para a casa do presidente Michel Temer, no bairro do Alto de
Pinheiros, onde houve confronto com a polícia, que dispersou manifestantes com
bombas de gás e balas de borracha. Ao todo, a PM divulgou ter prendido 36
pessoas em todo o Estado nas manifestações.
Em capitais como Salvador e Recife as linhas de ônibus
deixaram de funcionar completamente por 24 horas. Em São Paulo, no Rio e em
Belo Horizonte, a paralisação foi parcial. Metrôs e trens funcionaram
parcialmente na maioria das cidades.
Em Recife e Salvador, paralisação de ônibus foi total;
mais de 150 cidades tiveram manifestações.
Em Manaus, a Polícia Civil também se manifestou contra as
reformas e suspendeu o abastecimento dos carros.
Em Teresina, agentes penitenciários anunciaram
paralisação por 24 horas e dizem que não vão receber presos nos presídios.
O centro do Rio de Janeiro teve confronto em militares e
manifestantes em diversos pontos. Desde a madrugada da sexta-feira, ao menos
cinco ônibus foram incendiados. No início da noite, ainda havia cenas de
violência na cidade.
Até o momento, não há estimativas finais da Polícia
Militar para manifestações pelo país, nem números oficiais de quantos
trabalhadores pararam as atividades, mas centrais sindicais dizem que
paralisação é a maior da história do Brasil - teria ultrapassado a adesão de 35
milhões de pessoas conseguida em 1989.
A greve foi convocada pelas principais entidades
sindicais do Brasil: CUT (Central Única dos Trabalhadores), CTB (Central dos
Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), Intersindical, CSP-Conlutas (Central
Sindical e Popular), UGT (União Geral dos Trabalhadores), Força Sindical, Nova
Central, CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros) e CGTB (Central Geral dos
Trabalhadores do Brasil).
BBC
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